Laboratório do Complexo da Rede Ebserh no Rio de Janeiro (RJ) desenvolve método pioneiro para diagnóstico rápido de câncer infantil
No Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CH-UFRJ), administrado pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), um núcleo de pesquisa e diagnóstico vem encurtando o tempo de espera por resultados que podem salvar vidas. Fundado em 2009, o Núcleo Transdisciplinar de Investigação em Saúde da Criança e do Adolescente, vinculado ao Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), integra ensino, pesquisa e assistência, oferecendo exames de alta complexidade para o Sistema Único de Saúde (SUS).
A proposta central do Núcleo é aproximar a pesquisa da realidade clínica, desenvolvendo métodos diagnósticos inovadores e mais ágeis, com impacto direto na vida de crianças e adolescentes. Segundo a professora Elaine Sobral da Costa, coordenadora do espaço, o trabalho alia diagnóstico laboratorial, pesquisa translacional e formação de profissionais. “Todos os diagnósticos mais complexos do hospital passam por aqui. Também desenvolvemos novos métodos diagnósticos e formas de avaliação prognóstica, para antecipar se o paciente vai evoluir bem ou mal e ajustar o tratamento”, explicou.
O diferencial mais recente e de maior impacto é o método pioneiro de diagnóstico rápido para tumores sólidos pediátricos, uma inovação desenvolvida no próprio IPPMG, patenteada em 2020 e atualmente aplicada em sete países. A nova técnica, baseada em citometria de fluxo, reduz drasticamente o tempo de diagnóstico desses tumores, passando de cerca de 20 dias (média da análise histopatológica tradicional) para apenas um dia. “Se a criança é operada pela manhã, o resultado do exame fica pronto no mesmo dia. Isso faz uma diferença monstruosa para quem está em situação crítica”, destacou Elaine.
A trajetória até esse avanço envolveu um esforço coletivo de pesquisadores da UFRJ e de outras instituições, reunidos no EuroFlow Consortium, um consórcio internacional que inclui centros de pesquisa de diversos países europeus.
Exames de alta complexidade e logística ágil
Fora o método de diagnóstico rápido para tumores, o Núcleo realiza uma gama variada de exames. Na área de Citogenética, por exemplo, são feitos cariótipos para detectar alterações cromossômicas em doenças genéticas e leucemias, além de testes de FISH (hibridização in situ por fluorescência) para identificar alterações específicas no DNA. “O FISH é mais específico que o cariótipo, mas depende de uma suspeita prévia, pois só analisa a região de interesse”, falou a citogeneticista, e chefe do laboratório de genética, Amanda Figueiredo. Ela também ressaltou a realização de exames moleculares como PCR e gel de agarose, utilizados no diagnóstico de condições como genitália ambígua e síndrome do X Frágil.
O fluxo das amostras segue uma logística cuidadosamente planejada. Após a cirurgia, o patologista do hospital seleciona o fragmento mais adequado e o encaminha, em gelo, ao Núcleo. A equipe então faz a triagem, dissocia as células tumorais e aplica um painel de anticorpos específico, de acordo com a suspeita clínica. “A localização do tumor, o hemograma e a avaliação clínica ajudam a direcionar quais exames realizaremos”, explicou a aluna de mestrado da pós-graduação em Saúde Materno Infantil da UFRJ, Daniele Guimarães. Muitas vezes, a análise é feita ainda na madrugada, dada a urgência dos casos.
Além do atendimento ao IPPMG e ao Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), o Núcleo presta suporte diagnóstico para outras unidades públicas, como o Hospital da Lagoa, o Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP) e, eventualmente, o Instituto Nacional de Câncer (Inca), sempre priorizando pacientes do SUS.
Produção científica com impacto internacional
Já no campo da pesquisa, o Núcleo tem se destacado por uma produção científica com repercussão internacional. O método de diagnóstico rápido de tumores pediátricos foi detalhado em um artigo publicado na revista Cancers em 2021. Antes disso, em 2013, os primeiros resultados da equipe sobre o tema saíram na PLoS One. Outro estudo de destaque, também na Cancers, em 2022, investigou o microambiente da medula óssea em casos de leucemia aguda infantil, com foco na relação entre células estromais e risco de recaída (leia aqui). Mais recentemente, em 2023, o grupo participou de um estudo sobre mieloma múltiplo, reforçando a capacidade de diagnóstico e monitoramento da doença residual mínima no Brasil.
A atuação do Núcleo também extrapola as fronteiras da universidade. Em abril de 2024, o IPPMG sediou o 4º Workshop EuroFlow Educacional Brasileiro, evento que reuniu especialistas internacionais para discutir os avanços mais recentes na citometria de fluxo aplicada ao diagnóstico de neoplasias hematológicas e imunodeficiências primárias.
“O que fazemos aqui é ciência aplicada à vida real. Cada diagnóstico rápido que entregamos é uma chance a mais para uma criança começar o tratamento a tempo”, finalizou Elaine.
*Fonte: Coordenadoria de Comunicação Social da Rede Ebserh